A luta histórica da Associação das Vítimas da Contaminação por Chumbo, Cádmio, Mercúrio e Outros Elementos Químicos (Avicca), em Santo Amaro da Purificação, alcançou um marco inédito e de grande impacto para o país. O Poder Judiciário reconheceu a responsabilidade de três empresas pelo desastre ambiental que contaminou, durante décadas, o ar, o solo e as águas do rio Subaé, afetando profundamente a saúde e a vida de milhares de moradores.
A decisão também homologou a tese de racismo ambiental defendida pela Defensoria Pública do Estado da Bahia (DPE/BA), consolidando o caso como um precedente nacional na articulação entre justiça ambiental, reparação coletiva e enfrentamento às desigualdades estruturais.
Racismo ambiental reconhecido pela Justiça
Ao assumir o processo como uma pauta estratégica, a DPE/BA argumentou que o passivo tóxico e seus impactos recaíram de maneira desproporcional sobre populações negras, periféricas e historicamente excluídas. A sentença acolheu essa perspectiva, descrevendo o episódio como um caso de contaminação ambiental e humana em larga escala, que atingiu trabalhadores, moradores do entorno da fábrica, pescadores, marisqueiras e comunidades vulnerabilizadas.
Os danos, provocados entre as décadas de 1960 e 1990, continuam afetando a região e as gerações seguintes, tornando Santo Amaro um dos cenários mais graves de injustiça ambiental no Brasil.
Atuação da Defensoria e mobilização comunitária
A DPE/BA iniciou sua atuação no caso em 2018, com forte trabalho extrajudicial de articulação e apoio às famílias impactadas. A defensora pública Martha Cavalcante, coordenadora da Especializada de Fazenda Pública de Salvador e do COMSaúde, destaca que a mobilização da comunidade foi decisiva para que as violações fossem reconhecidas.
Indenizações, reparação ambiental e crítica à “irresponsabilidade organizada”
A sentença determina que as empresas paguem indenizações por danos morais e materiais às vítimas, com valores maiores para crianças e pessoas negras — reconhecimento direto da desigualdade racial envolvida no caso. Também estabelece ações de reparação ambiental e a criação de um fundo social para iniciativas de educação e qualificação profissional.
O Judiciário ainda criticou o que chamou de “irresponsabilidade organizada”, estratégia utilizada pelas empresas ao longo dos anos por meio de fusões e alterações societárias para escapar da responsabilização.
Apesar da vitória judicial, Martha Cavalcante ressalta que as marcas deixadas pela contaminação são profundas e contínuas. “As vidas perdidas não serão devolvidas. As pessoas vêm adoecendo desde a década de 1960 e vão continuar doentes porque a contaminação persiste”, afirma. Ela destaca que rios, lençol freático, ar, solo, animais e manguezais permanecem comprometidos, evidenciando que o dano ambiental segue recaindo sobre populações negras e de baixa renda — um padrão global de injustiça.
Para a defensora, o caso de Santo Amaro deve servir como alerta à sociedade e ao poder público sobre a urgência de garantir um meio ambiente saudável como direito fundamental. A decisão reforça o protagonismo da Defensoria Pública da Bahia na construção de um modelo de Justiça comprometido com a vida, a dignidade humana e a proteção dos territórios vulnerabilizados.
Com informações da Defensoria Pública da Bahia.
Conexão Recôncavo segue acompanhando os desdobramentos deste caso emblemático para o Recôncavo Baiano e para o Brasil.
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